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Aprofundamento

COM FOME

NÃO HÁ INOVAÇÃO

Fernanda Cardillo e Nicole Fonseca

14 de maio de 2021

Image by Sigmund

A fome voltou para assombrar os brasileiros. O Brasil havia deixado o Mapa da Fome  em 2013 com o amplo alcance do programa Bolsa Família – estudo do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), quando apenas 3,6% dos brasileiros estavam em situação alimentar grave. Entretanto, o país volta a figurar na geopolítica da fome.

O Mapa da Fome é um levantamento realizado pela ONU (Organização das Nações Unidas), sobre a situação global de carência alimentar. Um país entra neste levantamento quando a subalimentação afeta 5% ou mais da sua população.

O IBGE, que desde 2018 vem divulgado os resultados da Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF), revela que de cada dez famílias brasileiras quatro não têm acesso regular e permanente a uma quantidade suficiente de comida diariamente, segundo a pesquisa esses dados representam 85 milhões de brasileiros passando algum tipo de dificuldade, desses 10 milhões relataram passar fome. Se agravando em lares chefiados por mulhes e negros. 

A pesquisa ainda mostra que as áreas rurais, e as regiões Norte e Nordeste apresentam um alto índice de insegurança alimentar. Esta pesquisa nos mostra que a situação da fome no país já se agrava desde antes da pandemia de COVID-19, com a precarização do emprego; crescimento do desemprego entre outros fatores que contribuíram para a volta da fome em milhões de lares brasileiros.

 

Porém, com a chegada do coronavírus, a fome que já vinha crescendo, superou no ano passado os índices da década passada. E que só não foi pior por conta do auxílio emergencial, no qual 63% dos beneficiários utilizaram para comprar comida, de acordo com uma pesquisa feita do grupo “Alimentos para Justiça" da Universidade Livre de Berlim, em parceria com a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e Universidade de Brasília (UnB). 

Explicitando ainda mais a falta do básico no país, lavar as mãos, que é uma das principais recomendações no controle do vírus, depende do acesso à água tratada. E que de acordo com o Instituto Trata Brasil, quase 35 milhões de brasileiros não têm acesso a este serviço básico. Dessa forma, a COVID-19 teve o papel fundamental de deixar evidente que apesar do Brasil ser uma das maiores economias, a nação ainda sofre com problemas medievais, escancarando a desigualdade social.

Com as medidas de fechamento do comércio, isolamento social e lockdown, obrigaram a população a se reinventar e inovar. Com metade do país em home office e a outra metade passando fome,  adivinhe quem precisa sair do óbvio para sobreviver?

Afinal, o home office só foi adotado pelas classes A e B. E não há falta de exemplo de pessoas que perderam seus empregos e tiveram que desenvolver uma nova habilidade, como costurar máscaras, produzir doces e até se expor nas ruas por conta de um trabalho presencial.

A Ensaio acredita que o ato de inovar surge com três pilares: Ser sustentável, ter impacto positivo e a existência de um ROI (Retorno sobre investimento). Dessa forma, a pandemia acelerou o processo de inovação nas empresas que se mantiveram ativas, mas deixou um marco na economia do país.

O desemprego, que hoje atinge uma taxa de 14,5%, trouxe uma romantização do básico, fantasiando-se de inovação. No início deste ano, uma matéria contava a história de uma mãe e duas filhas que viviam nas ruas do Rio de Janeiro, e a reportagem não destacava o fato desta família viver na rua, o desemprego ou a extrema pobreza, o destaque ia para o fato delas manterem a calçada limpa.

Uma outra reportagem assustadora é sobre a volta do uso do fogão a lenha, romantizando a troca do botijão de gás por fogão a lenha  como forma de fazer a comida render mais, economia doméstica e a substituição de itens básicos. Essa romantização não pode ser considerada como uma forma de "pensar fora da caixa", já que a alta dos preços dos alimentos básicos não pode ser vista com normalidade.

A inovação surge como resposta para solucionar problemas complexos, que necessitam de grande aprofundamento, entendimento e testes, para a partir disso inovação ter seu espaço. Em casos como os de tantos brasileiros, que passam necessidade e sofrem com o despreparo do governo, é muito simples apontar que a solução seria inovar. A partir do momento em que o básico não está mais acessível, é porque aquele indivíduo foi privado de outros itens e oportunidades anteriormente. Com isso, fica claro o regresso que o país está vivendo em diferentes aspectos, podendo chegar até o limite da miséria, que fica explícita com a volta do Brasil no mapa da fome.

A inovação social já existia antes da pandemia de COVID-19, contudo ganhou ainda mais força durante a mesma. Grandes empresas, como a Samsung, possuem seu próprio centro de inovação social. No caso da empresa de smartphones, há o Open Innovation Center, que visa identificar e desenvolver as melhores tecnologias e infraestruturas pensando no futuro. Dessa forma, ela conecta propostas inovadoras com a expertise da empresa de tecnologia. Por outro lado, com a chegada do novo coronavírus, o terceiro setor tem sofrido com a falta de arrecadação de doações e de suporte do governo. A inovação nesse ramo surge como uma ponte entre iniciativas privadas e ONGs, gerando uma forma de aceleração da mesma. 

Dessa forma, em um contexto quase que distópico como o atual, a população e empresas precisam se desdobrar para sobreviver. Atos de solidariedade e colaboração, um dos principais pilares da inovação, são o que mantém muitos em pé. Com isso, existe um quase esquecimento da existência do Estado, fazendo com que empresas e ONGs assumam o papel do mesmo. A pergunta que fica é: E o governo?

Temos uma provocação a fazer no próximo Pico.

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