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Provocações

É VOCÊ QUE AMA

O PASSADO E QUE NÃO VÊ

Nalu Tomba e Nicole Fonseca

12 de agosto de 2021

Image by Nicola Ricca

Que o novo sempre vem.

 

Não queríamos vir aqui e lhe falar que “antigamente as coisas eram muito melhores”. Por inúmeros motivos, mas o principal deles é que essa é uma visão egocêntrica e vã.

 

 

Antigamente quando?

Que coisas?

Melhores para quê? Melhores para quem?

 

Mas a nostalgia é um lugar gostoso de se visitar. É a maquiagem do passado.

 

E quando há passado, há história vivida. Seres humanos vivem de histórias e para contar histórias. Vai dizer que você nunca se imaginou, no alto dos seus 80 anos, parafraseando Belchior para qualquer um de menos idade: 

“Quero lhe contar como eu vivi

E tudo o que aconteceu comigoooo…”

Essa fantasia é legal mesmo. Certamente a gente já ouviu algo parecido de nossos avós.

 

A grande graça do tempo é ouvir como as pessoas o viveram e o descrevem. E, falando nisso, os tempos são outros, por isso, cuidado, meu bem: há perigo na esquina. Eles venceram e o sinal está fechado para nós, que somos jovens.

 

E nós, que somos jovens, provavelmente fazemos parte da geração Y (millennials) ou Z.


 

Você me pergunta pela minha paixão

Digo que estou encantada como uma nova invenção

Para falarmos de gerações, é preciso fazer um corte temporal. Relembrando:

Geração Baby Boomers: nascidos entre 1940 e 1960 -  vivenciaram eventos globais como a Guerra do Vietnã ou a chegada do homem à Lua. Tendo as guerras como pano de fundo, desenvolveram a lealdade como uma das características mais marcantes.

Geração X: nascidos entre 1960 e 1980 - viram o fim da Guerra Fria e o avanço da aids. O cenário de escassez refletiu em um comportamento de bastante resiliência.

Geração Y: nascidos entre 1980 e 1995 - cresceram em um mundo já digitalizado e viveram o boom do American Way Of Life. Com mais “facilidades”*, não aceitam ouvir “não”.

Geração Z: nascidos entre 1995 e 2010 - completamente conectados, com o mobile sendo uma extensão do corpo e, agora, no cenário pandêmico, monopolizaram a presença e o avanço digital.

 

*É preciso fazer uma grande ressalva quando falamos em “facilidades”: o desenho das gerações é pautado em um padrão generalizado, considerando o cenário global. A desigualdade social - especialmente no Brasil - não foi atenuada no período. Pelo contrário.

Apesar de utilizarmos estes recortes e eventos para falarmos das gerações, é preciso fazer algumas considerações:

 

  • As datas de nascimento variam muito conforme as fontes e não há um consenso sobre elas;

  • Alguém nascido em 1990 pode ter um comportamento parecido de alguém nascido em 1980 em outro lugar do país, em outra situação socioeconômica, em outro contexto;

  • Os nascidos no início de uma geração sofrem influência da geração anterior, por isso alguns comportamentos se misturam. Por exemplo, quem nasceu no início da década de 80 talvez tenha mais características da Geração X que dos millennials;

  • Além disso, dentro do recorte geracional, não estaremos nos referindo a gênero, classe social e cor.

Nos últimos meses, a discussão das gerações tomou conta da internet. E, claro, bem como tudo que Rei Midas tocava virava ouro, tudo o que o internauta toca vira meme e piada. Mas, para os pesquisadores, essas divisões têm bastante importância: "são uma ferramenta para analisarmos mudanças de visões ao longo do tempo", explica em texto Michael Dimoch, presidente do Pew, um Instituto de Pesquisas dos EUA.

Uma pesquisa realizada pela Comscore “A próxima fronteira da mídia”, para mapear os diferentes hábitos de consumo entre as gerações X, Millennial e Z, destacou que o principal meio para consumir informações é o celular, e que essa migração já é superior a 50%.

 

A pesquisa também destacou que a maior parte dos jovens da geração Z (66%) tende a ler as notícias de forma rápida e superficial, como podemos observar através do crescente uso do polêmico TikTok, que é a rede social que mais atrai o público jovem, ou seja, geração Z.

 

O uso em demasia vem enfrentando duras - e necessárias - críticas, afinal, a maioria dos usuários estão em intensa fase de formação psíquica, comportamental, e etc. (a gente sabe que adolescência é um período… Estranho, por assim dizer). O reflexo dessa produção de “conteúdo” desenfreada e que ignora alguns filtros morais já aparece de maneira nada sutil. Milhares de jovens atingem o pico da fama e o “fundo do poço” em questão de meses - ciclo que antes levaria ao menos 5 anos para acontecer com uma subcelebridade. Em julho deste ano, a médica Fernanda Rocha Kanner prezou pela saúde e formação da filha no lugar dos 2 milhões de seguidores que a adolescente tinha na rede social. É um texto que vale a pena ser lido e refletido.

Este comportamento é bem diferente na geração X, em que a maioria (53%) gosta de se dedicar mais à leitura para compreender todo o conteúdo, sobretudo em relação às notícias de caráter global, nacional e regional.

 

A lista de comparação e diferenças entre gerações é infindável. Mas nos concentremos no consumo de informação: é uma das maiores evidências do porquê presidentes foram eleitos através de fake news no WhatsApp, inocentes foram linchados em praça pública por acusações falsas e o terraplanismo voltou a ser abordado com seriedade.

Nossos ídolos ainda são os mesmos

E as aparências não enganam, não

Por outro lado, vivemos uma intensa fase de questionamentos, de inquietações. Falamos e ouvimos falar, com muita frequência, sobre “desconstruir” e “ressignificar” conceitos e tradições com séculos de solidez - Bauman mandou um abraço. E quando unimos esse cenário com a informação de que a geração Z não tem o costume de se aprofundar em notícias, a pergunta que nos surge é: afinal, as novas gerações estão desconstruindo, destruindo ou construindo?

 

Não saberemos tão cedo se há um limite para todo esse esfacelamento de tradições, ou até mesmo se é preciso ter um limite. Neste sentido, ao que parece, estamos engatinhando. A impressão que se tem é que estamos, primeiro, tirando toda a poeira que nossos antepassados varreram para debaixo do tapete, para que depois decidamos o que faremos com ela.

 

Mas, e agora, estamos falando diretamente com os alecrins dourados chamados millenials: nós não fomos os primeiros a ter essa impressão. Não somos os enviados em nome da justiça. O mundo vem se desconstruindo e construindo à medida que também o destruímos.

 

Todas as gerações são repletas de certezas, porque a história nos tece e nós tecemos a história. E os anos apenas significam este compilado de erros e acertos que são de nossa responsabilidade como espécie.

 

A vida é cíclica, meu diamante lapidado, minha fada sensata. Por mais que nossos pais digam que “depois deles não apareceu mais ninguém”, e nós os refutemos, a gente ainda vai falar o mesmo. Afinal, hoje a gente sabe que foram eles que nos deram a ideia de uma nova consciência e juventude.

Você pode até dizer que eu tô por fora

Ou então que eu tô inventando

 

Se sua dor também é perceber que apesar de termos feito tudo o que fizemos, ainda somos os mesmos e vivemos como os nossos pais, não se aflija; Belchior pode até estar certo, mas ele também deixa o recado: o novo sempre vem.

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